Será enviado para a análise da Câmara dos Deputados o projeto que cria o Sistema Nacional de Educação (SNE). De autoria do senador Flávio Arns (Podemos-PR), o Projeto de Lei Complementar (PLP) 235/2019 foi aprovado no Senado, nesta quarta-feira (9), na forma de um substitutivo, apresentado pelo senador Dário Berger (MDB-SC). A votação foi unânime, com 74 votos. A matéria já havia sido aprovada na Comissão de Educação (CE), em novembro do ano passado, e estava prevista para ser votada no plenário no último dia 23 de fevereiro. No entanto, por um acordo pedido pelo governo, a matéria foi retirada de pauta.
O SNE pretende alinhar e harmonizar políticas, programas e ações da União, do Distrito Federal, de estados e de municípios, em articulação colaborativa dos entes da Federação na área educacional. A ideia é universalizar o acesso à educação básica e garantir seu padrão de qualidade; erradicar o analfabetismo; garantir equalização de oportunidades educacionais; articular os níveis, etapas e modalidades de ensino; cumprir os planos de educação em todos os níveis da Federação; e valorizar os profissionais da educação, entre outras ações.
De acordo com o texto aprovado, o objetivo principal do SNE será “a cooperação e a colaboração em matéria educacional entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios”, conforme determina a Constituição de 1988. Dario Berger registrou, em seu relatório, que a integração dos sistemas é também um mandamento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB – Lei 9.394, de 1996).
— Essa demanda histórica se torna ainda mais urgente quando se consideram os desafios que enfrentamos durante a pandemia de covid-19. A aprovação desse projeto é um momento histórico para o Senado e para a educação brasileira — afirmou.
Dario Berger disse que foram dois anos de debate até chegar ao texto final. Ele afirmou que o SNE é uma forma de honrar a luta de tantos educadores brasileiros por uma educação de qualidade mais acessível para toda a população. Como exemplo, ele citou o professor Anísio Teixeira (1900-1971), que defendia a escola pública como promotora da democracia.
O relator agradeceu as sugestões de entidades ligadas à educação, as colaborações de representantes do governo e o apoio de colegas senadores na construção do texto final. Ele ainda comparou a integração do SNE ao Sistema Único de Saúde (SUS), que unifica a saúde pública no país. Na visão de Dário Berger, o projeto poderá provocar um grande impacto na qualidade da educação nacional.
— O SNE representa o maior avanço na gestão educacional do país nas últimas décadas. Será uma vitória dos alunos, dos professores e do Brasil. O futuro de uma nação depende do valor que se dá à educação no presente — argumentou o relator.
O senador Paulo Rocha (PT-PA) classificou a matéria como “muito importante” para a educação brasileira. Para a senadora Rose de Freitas (MDB-ES), o SNE vai modernizar a educação nacional e enche o Senado de orgulho. Por sua vez, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) lamentou a situação precária de muitas escolas na atualidade. Ele disse que o SNE pode ser “um passo a mais” em busca da qualidade da educação no país. Marcelo Castro (MDB-PI) definiu o SNE como a matéria mais importante desta legislatura. Ele classificou o projeto como “transformador e revolucionário”.
Segundo Confúcio Moura (MDB-RO), o projeto do SNE é “grandioso”, pela capacidade de transformar a educação. Ele elogiou o caráter compartilhado da gestão da educação, previsto na matéria. Na visão de Chico Rodrigues (DEM-RR), o projeto tem o potencial de revolucionar a educação do Brasil. O senador Esperidião Amin (PP-SC) parabenizou Flávio Arns pela iniciativa da matéria e Dario Berger pelo trabalho na relatoria. Na mesma linha, Jorginho Mello (PL-SC) destacou o papel do autor e do relator da proposição.
— A educação é a melhor ferramenta para conduzir a vida do país – registrou Jorginho Mello.
Flávio Arns agradeceu o apoio dos colegas senadores e disse que o trabalho até o texto final do projeto foi muito intenso, com a realização de muitas audiências e debates. Ele elogiou a parceria com Dário Berger e afirmou que a educação precisa ser encarada como prioridade absoluta para o país.
— Se queremos ter um país mais justo e desenvolvido, esse caminho só será possível pela educação — registrou o autor.
De acordo com Dario Berger, seu texto substitutivo inova ao fortalecer e valorizar “o papel dos profissionais da educação e a integração da educação escolar pública com a sociedade, por meio da gestão democrática”. Nesse sentido, o projeto cria o Fórum de Valorização dos Profissionais de Educação, com representantes dos governos e da sociedade civil organizada. Um dos focos desses fóruns será a atualização progressiva do piso salarial nacional da educação básica.
— O SNE é uma oportunidade de avançar e superar os limites da estagnação e da inoperância no campo educacional, por meio do diálogo e da construção conjunta de horizontes — declarou o relator.
Das 27 emendas apresentadas, Dario Berger acatou 16, de forma total ou parcial. Conforme uma sugestão da senadora Rose de Freitas, o projeto determina que, em casos de estado de calamidade, ou de emergência de saúde pública, ficará a critério dos sistemas de ensino a realização de atividades pedagógicas não presenciais. A proposta trata, ainda, de territórios etnoeducacionais indígenas – sugestão do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR).
O relator também acatou uma sugestão de Randolfe Rodrigues (Rede-AP), para incluir entre as diretrizes a garantia de uma educação voltada à promoção da cidadania, da diversidade sociocultural, da sustentabilidade ambiental, dos direitos humanos e do combate a qualquer tipo de preconceito, discriminação, violência. Outra emenda acatada, do senador Paulo Paim (PT-RS), estabelece que na esfera da valorização e do desenvolvimento profissional permanente dos profissionais da educação, devem ser resguardadas a autonomia e a liberdade de atuação do profissional, bem como a contextualização histórica, política, cultural e social do conhecimento.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES) também teve sua emenda acatada. Assim, o texto passa a prever, entre os objetivos do SNE, “a efetiva contribuição” para implementar a prestação de serviços de psicologia e de serviço social nas redes públicas de educação básica. Segundo o relator, é uma forma de colocar em prática o serviço já previsto na Lei 13.935, de 2019.
O texto apresenta princípios e diretrizes do SNE, como igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola; equidade na alocação de recursos e na definição de políticas; articulação entre a escola, o trabalho e as práticas sociais; garantia de políticas inclusivas para os alunos com deficiência, transtornos globais e altas habilidades; atendimento às necessidades específicas das populações do campo e das comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas; valorização e desenvolvimento permanente dos profissionais da educação; entre outros.
O projeto também elenca vários objetivos do SNE, como universalizar o acesso à educação básica de qualidade; erradicar o analfabetismo; fortalecer mecanismos redistributivos, com padrão mínimo de qualidade; assistência técnica, pedagógica e financeira; garantir adequada infraestrutura física, tecnológica e de pessoal para todas as escolas públicas, inclusive em termos de condições sanitárias, de acessibilidade e de conectividade; implementação conjunta de políticas, programas e ações; e assegurar a participação democrática nos processos de planejamento, coordenação, gestão e avaliação.
Conforme previsto no projeto, caberá à União coordenar o SNE, articulando os diferentes níveis e sistemas de ensino, prestando assistência técnica e financeira aos demais entes. Também há competências específicas para estados e municípios. Serão criadas a Comissão Intergestores Tripartite da Educação (Cite), instância de âmbito nacional, responsável pela negociação e pactuação entre gestores da educação dos três níveis de governo; e as Comissões Intergestores Bipartites da Educação (Cibe), instâncias de âmbito subnacional, responsáveis pela negociação e pactuação entre gestores da educação de estados e municípios.
A Cite e as Cibes serão os fóruns responsáveis por definir parâmetros, diretrizes educacionais e aspectos operacionais, administrativos e financeiros do regime de colaboração, com vistas à gestão coordenada da política educacional.
Também está previsto o chamado Custo Aluno Qualidade (CAQ), ou seja, o valor mínimo que o poder público precisa investir por aluno com vistas a uma educação de qualidade. Por sugestão do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), o CAQ vai considerar, em âmbito nacional, a abordagem por resultados. Dário Berger destacou que o CAQ poderá acabar com “a triste realidade” de muitas escolas sem estrutura mínima necessária. Ele citou casos de escolas sem biblioteca e até sem vaso sanitário.
— Este é um projeto que vai permanecer de forma altiva e grandiosa. Não se trata de um projeto de governo, mas de estado — apontou o relator.
Estados, municípios e Distrito Federal terão até dois anos para aprovar lei específica de criação dos respectivos sistemas estaduais, distrital e municipais de educação. O Ministério da Educação terá que prestar assistência técnica aos entes federados. O substitutivo prevê, ainda, dispositivos para tratar da avaliação da educação nacional, integrando ao SNE o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Sinaeb) e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes).
O relator também estabeleceu a criação, no âmbito da Cite, da Câmara Intergovernamental de Financiamento para a Educação Básica de Qualidade (Cifeb) – colegiado que será responsável pelas diretrizes de financiamento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). A Cifeb vai abarcar as atribuições hoje definidas para a Comissão Intergovernamental de Financiamento da Educação Básica de Qualidade.
Entre outras atribuições, a Cifeb vai lidar com ponderações aplicáveis nas questões socioeconômicas dos alunos, metodologia de cálculo do custo médio das diferentes etapas da educação básica e cálculos relacionados à disponibilidade de recursos vinculados à educação.
O projeto ainda traz a previsão de que a avaliação global sobre o Plano Nacional de Educação (PNE) em vigência será conduzida pelo Ministério da Educação, com apoio do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O Inep deverá atuar na definição do CAQ, apresentando proposta que considere os impactos administrativos e orçamentários.