O Senado aprovou nesta terça-feira (22), por unanimidade, o projeto de lei que endurece as penas para crimes contra crianças e adolescentes, cria mecanismos de enfrentamento à violência doméstica e institui o Dia Nacional de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Criança e o Adolescente. O projeto (PL 1.360/2021) é conhecido como Lei Henry Borel, em homenagem ao garoto de quatro anos assassinado em 2021 no Rio de Janeiro. A mãe e o padrasto do menino foram denunciados pelo crime.
O projeto foi apresentado pelas deputadas federais Alê Silva (PSL-MG), Carla Zambelli (PSL-SP) e Jaqueline Cassol (PP-RO). A relatora da matéria no Senado, Daniella Ribeiro (PP-PB), alterou o texto que havia sido aprovado pela Câmara em fevereiro e acolheu emendas apresentadas pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES). Devido a essas mudanças, a matéria voltará para a análise da Câmara.
A proposta agrava a punição para o crime de homicídio contra menor de 14 anos. Pelo Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940), a pena para os casos de homicídio simples vai de 6 a 20 anos. O PL 1.360/2021 aumenta essa penalidade em dois terços se o autor é ascendente da vítima (por exemplo: pai, mãe, avô, avó), padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se por qualquer outro título tiver autoridade sobre a vítima menor de 14 anos. Se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que a torne mais vulnerável, a pena pode ser aumentada de um terço até a metade.
O projeto também inclui o crime de homicídio contra menor de 14 anos entre aqueles considerados hediondos. Pela Constituição Federal, eles são inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia.
O PL 1.360/2021 também muda a forma de contagem de tempo para a prescrição de crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra criança e adolescente. De acordo com o texto, o prazo só começa a contar na data em que a vítima completar 18 anos. O texto também proíbe que casos de violência doméstica e familiar contra criança e adolescente sejam punidos apenas com o pagamento de cestas básicas ou penas em dinheiro.
Outro dispositivo do projeto prevê pena de 6 meses a 3 anos para quem deixar de comunicar à autoridade pública a prática de violência contra criança ou adolescente. A mesma regra valerá, segundo a proposta, para quem se omitir nos casos de tratamento cruel ou degradante, formas violentas de educação, correção ou disciplina e abandono de incapaz.
O texto também prevê que, se a omissão resultar em lesão corporal de natureza grave na vítima, a pena será aumentada na metade; se resultar em morte, ela será triplicada; no caso de o crime ser praticado por ascendente, parente consanguíneo até terceiro grau, responsável legal, tutor, guardião, padrasto ou madrasta da vítima, a pena será aplicada em dobro.
De acordo com o projeto, o juiz pode determinar o comparecimento obrigatório do agressor em programas de recuperação e reeducação. Caso o agressor descumpra medidas protetivas impostas pela Justiça, o texto determina que ele ficará sujeito a detenção de 3 meses a 2 anos.
O PL 1.360/2021 cria o Dia Nacional de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Criança e o Adolescente. A data seria celebrada anualmente em 3 de maio, data de nascimento do garoto Henry Borel. Relatora da matéria, Daniella Ribeiro disse que o Congresso faz história com o projeto e homenageou o pai do menino, Leniel Borel, que ainda busca justiça no caso da morte do filho.
— O menino Henry Borel, que se tornará o nome dessa lei, foi assassinado barbaramente dentro de casa, um lugar onde todos nós costumamos nos sentir seguros e protegidos — lembrou ela, que também afirmou que a lei fará justiça a "milhões de Henrys" que sofrem violência diariamente.
A relator citou dados de casos de violência contra crianças e adolescentes que classificou como estarrecedores. De acordo com a senadora, entre janeiro e setembro de 2021, o Disque 100, serviço de denúncias de violações de direitos humanos mantido pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, registrou mais de 119 mil denúncias de violência contra crianças e adolescentes.
A situação, segundo Daniella Ribeiro, é ainda mais grave, já que há subnotificação porque os agressores se aproveitam da fragilidade física e intelectual e da incapacidade de defesa das vítimas, com a certeza de que não haverá reação, denúncia e, consequentemente, punição
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) lembrou que mais de 60% dos casos de violência doméstica no Brasil acontecem com crianças de até 14 anos de idade. Ela elogiou o trabalho da relatora.
— Parabenizo a senadora pela brilhante relatoria. Tive a oportunidade de acompanhar antes e agora o relatório. Vossa Excelência teve a capacidade de reunir o que faltava para deixar esse texto completo.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN), que é médica e trabalhou em serviços de urgência, explicou que na grande maioria dos atendimentos a mulheres que sofriam violência, os filhos também haviam sido vítimas, muitas vezes por tentar defender as mães.
— Se a gente não segurar com leis fortes essas mãos que esmagam, que batem em mulheres e crianças neste país, quem vai fazer isso? O Henry Borel, gente, tenho até dificuldade de ler as notícias sobre essa criança sendo espancada até a morte dentro de casa — lamentou a senadora.