Mostrar a insegurança jurídica em que vivem os produtores à espera de regularização fundiária na Amazônia Legal, em especial no estado de Rondônia — colonizado por agricultores das Regiões Sul e Sudeste do Brasil nas décadas de 1960 e 1970 — foi a proposta da audiência pública promovida nesta quinta-feira (7) pela Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA).
Requerida pelo presidente da CRA, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), e pelo senador Lasier Martins (Podemos-RS), a audiência funcionou como mais um instrumento de embasamento para a análise, pelo colegiado e pela Comissão de Meio Ambiente (CMA), de projetos de lei sobre o tema.
Em reunião conjunta das duas comissões em 8 de dezembro, o senador Carlos Fávaro (PSD-MT) apresentou seu relatório às matérias que tratam da regularização fundiária. O relator optou pela aprovação do PL 510/2021, do senador Irajá (PSD-TO), na forma de substitutivo de sua autoria, com acatamento integral ou parcial de emendas dos senadores. Em seu texto, Fávaro deliberou pela prejudicialidade do PL 2.633/2020, proveniente da Câmara.
— A necessidade de regularização fundiária, especialmente em Rondônia, é um tema de extrema relevância. Podemos falar de avanços, mas que estão longe dos benefícios que poderíamos levar ao homem do campo. (...) O objetivo dessa audiência é mostrar o que acontece quando não existe regularização e fazer um apelo para que possamos aprovar com urgência esse novo marco legal — afirmou Gurgacz.
Segundo o presidente da CRA, em 2020 o Brasil registrou 1,5 mil conflitos de terra, recorde desde 1985; e houve aumento de 30% no número de assassinatos derivados desses conflitos.
Secretário especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Luiz Antônio Nabhan Garcia, destacou o desbravamento das terras nortistas nas décadas de 1960 e 1970 por produtores sulistas.
— Essa regularização fundiária tem o objetivo de cumprir a questão social. (...) No Norte do país não tinha estrada, não tinha comunicação, só área de florestas, esperando por essas famílias, que eu considero heroínas. Jamais o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] pode esquecer de regularizar essas famílias; muitas até perderam seus entes para doenças como a malária — disse o secretário, ao acrescentar que é favorável à aprovação de nova legislação.
Diretor de Desenvolvimento e Consolidação de Projetos de Assentamento do Incra, Giuseppe Vieira reconheceu a necessidade de desburocratização dos órgãos que atuam com essa agenda — no caso o Incra, pelo Executivo federal —, assim como a necessidade de avanço da legislação.
Vieira salientou as dificuldades de regulamentação, diante da necessidade de reanálise de documentos frequentemente questionados. Os avanços ocorrem com mais facilidade, segundo o diretor, principalmente nas novas titulações.
— Não temos hoje na legislação uma forma simplificada para a resolução desses processos [mais antigos].
Desde 2019, foram emitidos pelo governo federal mais 237 mil documentos, sendo cerca de 15 mil em Rondônia, com regularização de muitas terras, segundo o diretor.
Com a nova tecnologia implementada, por meio da Plataforma de Governança Territorial, foi possível avançar na titulação, afirmou o superintendente do Incra em Rondônia, Mário Moacir de Almeida. Entre janeiro e março de 2022, foram emitidos no estado mais de 1,4 mil documentos.
— Estamos buscando o georreferenciamento para que possamos titular, e isso vai fazer com que avancemos bastante, tanto em assentamentos, como em terras públicas.
Para o coordenador fundiário e ambiental da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Rondônia, Edson Afonso Rodrigues, a regularização fundiária protege o meio ambiente. De acordo com Rodrigues, nova lei é necessária para facilitar a regularização das terras, o que não quer dizer que serão regulamentadas as ocupações ilegais.
— Há uma confusão entre as leis fundiárias e ambientais. Lei fundiária boa é parte da solução ambiental.
A regularização fundiária promoverá ainda elevação do produto interno bruto (PIB), segundo o coordenador. Em Rondônia, estima-se aumento de 40% em 5 anos.
— A regularização dará dignidade para milhares de produtores rurais. Os processos fundiários nunca terminam, as ações são iniciadas e não continuadas. As alterações de normas obrigam a reanálise de processos e o caos fundiário gera conflitos agrários.
Assessor técnico da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), José Henrique Pereira também enfatizou a preservação ambiental: no bioma amazônico, 84,1% estão preservados, disse, e há uso consolidado de 13,8% da região, dos quais 2,3% são destinados às lavouras, 10,5% às pastagens e 1% para as infraestruturas viárias e rurais.
— A área real passível de regularização da Amazônia Legal representa 5% da área total. (...) A titulação promove a proteção ambiental e a recomposição de vegetação nativa, já desmatada, nos moldes do novo Código Florestal; identifica os infratores e garante a adequada regularização para o combate à grilagem de terras, às queimadas e aos desmatamentos ilegais na região.
A CNA apoia o relatório do senador Fávaro, segundo Pereira. Ele destacou, em especial, a previsão de possibilidade de uso da tecnologia de sensoriamento remoto para pequenas e médias propriedades.
A CRA aprovou requerimento para a promoção de audiência pública para debater a utilização de remineralizadores com alternativa de manejo e uso de solos. O debate está inicialmente agendado para 28 de abril.
— Esse é um tema importante, pela guerra da Ucrânia e Rússia, pois estamos com dificuldades na importação de fertilizantes — disse Gurgacz.