Convidados ouvidos pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) nesta quarta-feira (30) divergiram sobre o PL 537/2019, que propõe regulamentação dos direitos trabalhistas dos empregados de cooperativas. Enquanto alguns sugeriram alterações no relatório, como a adequação de termos jurídicos, outros foram veementes em pedir o arquivamento da proposta. Uma terceira parcela concordou com a aprovação do projeto, em sua integralidade. A audiência pública foi presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que declarou somente ser possível construir uma proposta adequada por meio do debate.
O texto veio da Câmara dos Deputados e está sob relatoria do senador Eduardo Braga (MDB-AM), que já apresentou parecer favorável ao PL, sem alterações. Paim disse que todos os apontamentos da reunião serão levados ao conhecimento de Braga, declarando que essa discussão é de interesse de todos os trabalhadores do Brasil. Caso seja aprovada pela CAE, a proposição poderá seguir direto para o Plenário.
— As pessoas deixaram propostas na mesa, e tudo será conversado com o relator, para acharmos o encaminhamento que mais contemple o universo do movimento sindical. Há uma divergência profunda, percebi. Mas é possível construirmos um entendimento que abrace todos os sindicatos e todas as centrais. Estamos falando de 4.880 cooperativas e 18,8 milhões de cooperados, segundo a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). Ouvimos as entidades para deliberarmos a matéria com a certeza de que estamos no caminho certo. Como disse o famoso filosofo grego Sócrates: "Uma vida sem reflexão não vale a pena ser vivida" — avaliou Paim.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES) elogiou o debate e a atuação de Paulo Paim e expressou o desejo de ter, no Senado, mais representantes de minorias como negros e quilombolas. O parlamentar se mostrou otimista em relação à construção de um mundo melhor e parafraseou o poeta Thiago de Mello,
— Não temos caminho novo. O que temos é um novo jeito de caminhar.
O PL 537/2019 institui o Estatuto Profissional dos Trabalhadores Celetistas em Cooperativas. Entre outros pontos, o texto inclui trabalhadores contratados por cooperativas no quadro de proteção legal trabalhista, com fixação da jornada de trabalho, negociação coletiva, piso salarial e garantia de representação por organização sindical específica. As regras se aplicam a todos os trabalhadores de cooperativas sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), independentemente do objeto ou da natureza das atividades desenvolvidas pela cooperativa ou por seus associados, sem prejuízo da legislação aplicável.
Representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Amanda Gomes Corcino ressaltou a importância do cooperativismo, mas apontou um “ uso indevido de um projeto para fragmentar a representação sindical, além de reduzir direitos dos trabalhadores”. A debatedora considerou a unicidade sindical proposta no PL 537/2019 um ataque à categoria:
— Por que, no apagar das luzes desse governo, essa pressa de continuar a tramitação desse projeto que, para nós, significa uma pequena reforma sindical?
Para Eduardo Moraes Bestetti, da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), o PL 537/2019 traz pontos que geram desigualdade de condições entre empresas do mesmo ramo. Ele afirmou que o projeto emprega incorretamente o termo “categoria” e pediu uma mudança na redação, para evitar insegurança jurídica nas relações de trabalho do Brasil.
— Cabe ao Congresso Nacional reduzir os riscos de inconstitucionalidades. A CTB defende a alteração do projeto, preservando o conceito de categoria como “a reunião de profissionais ligados por um mesmo ofício ou profissão com identidade de condições ligadas ao trabalho e a definição pela atividade econômica preponderante da empresa, filial ou unidade produtiva”.
Mauri Viana Pereira, da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), criticou o que entende ser a tutela do Estado brasileiro sobre os trabalhadores e se mostrou contrário ao PL 537/2019. Para ele, o texto não traz benefícios aos empregados:
— Isso é reganhar o que já se ganhou. Vai ser criação de sindicato adoiado; é um tiro no nosso pé que vai dar no nosso peito.
O presidente da Confederação Brasileira Democrática dos Trabalhadores da Alimentação (Contac), Nelson Morelli, defendeu a unidade entre os trabalhadores e declarou que o PL 537/2019 não contribui em nada com os anseios da categoria.
Representante da Federação dos Trabalhadores da Alimentação do Rio Grande do Sul, Paulo Madeira observou que o projeto gera uma fragmentação do cooperativismo e defendeu que o texto seja extinto. Ele afirmou que o sistema já é bem representado e organizado em todos os setores e apelou para que os senadores arquivem a matéria:
— O momento não é propício para isso, e não entendo porque esse projeto está tramitando. Para mim, ele já está morto aqui.
Luiz Carlos da Rocha, da Federação dos Celetistas em Cooperativas do Paraná, disse que essa questão já é superada no Paraná, onde os trabalhadores são representados por sindicatos de cooperativas. Na opinião do debatedor, os demais participantes da audiência que pediram o arquivamento do projeto atacaram a proposição com base em subterfúgios errados:
— Ouvindo as falas, me preocupei, porque parece que as pessoas não leram o texto. Esse projeto assegura a liberdade plena desses trabalhadores de fazerem o que bem entenderem. E esse texto tem uma virtude: acabar com a judicialização. Onde houver sindicato de trabalhadores em cooperativas, outro sindicato qualquer não poderá roubar essa representação. As pessoas estão se opondo ao projeto por decisões erradas.
O representante da Força Sindical, da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Francisco Canindé Pegado, concordou com a aprovação do PL 537/2019, em sua integralidade.
Claudio Mendes Neto, da Central dos Sindicatos Brasileiros, se posicionou de forma diferente de outros representantes das sindicais e avaliou que os dirigentes dessas entidades desejam conhecer seus direitos. Para ele, o PL 537/2019 tende a incentivar o movimento e traz uma justiça natural para a categoria, proporcionando uma melhoria das negociações coletivas:
— O debate é salutar, e cada um tem um ponto de vista. E o ponto de vista do outro não é necessariamente errado sob a perspectiva do trabalhador em cooperativa, que quer o seu justo direito de poder se reunir e se posicionar. Acredito que o debate não termina nesta audiência pública e que todos aqui têm o mesmo objetivo: o do debate. Que ele continue, nesse sentido e nesse nível.
Segundo o autor do projeto, deputado Baleia Rossi (MDB-SP), em que pese a organização e a força econômica do cooperativismo, ainda não há legislação própria no país dispondo sobre o estatuto profissional dos trabalhadores que prestam serviços às cooperativas. Eduardo Braga, por sua vez, avalia que o PL 537/2019 ajudará a solucionar uma “lacuna, ou antes, uma ambiguidade jurídica” na condição dos trabalhadores contratados por cooperativas. Cabe a Braga a decisão de acolher ou não as sugestões resultadas do debate da CAE.