A rejeição do PL 490/2007 e a necessidade de o Congresso Nacional defender os direitos dos índios foram os principais pontos de audiência pública da Comissão de Meio Ambiente (CMA) nesta quarta-feira (25). A proposta, que tramita na Câmara dos Deputados, impediria índios de obterem o reconhecimento legal de suas terras tradicionais se não estivessem estabelecidos nelas antes da data de promulgação da Constituição de 1988. Essa tese é conhecida como “marco temporal”.
O debate foi requerido pelo senador Jaques Wagner (PT-BA), que preside a CMA. Ele considerou o PL 490 uma regressão. E destacou os protestos ao redor do país em defesa dos povos indígenas, mencionando que há propostas em tramitação no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF) tratando da temática.
Wagner criticou a aprovação de propostas legislativas diretamente pelos Plenários do Senado e da Câmara, sem uma discussão aprofundada, sob justificativa da pandemia de coronavírus, que impediu o funcionamento das comissões temáticas. Emocionado ao ouvir os representantes dessas populações, o parlamentar disse ser fundamental mitigar a violência contra os índios.
— Há uma corrida, uma marcha da insensatez no sentido de aprovar tudo sob o “guarda-chuva” da epidemia de covid-19. Estamos transformando o Plenário numa grande comissão. [...] Ninguém vive o drama da demarcação sem se envolver emocionalmente e tivemos aqui depoimentos contagiadores da alma — ressaltou.
O vice-presidente da comissão, senador Confucio Moura (MDB-RO), concordou com a necessidade de rejeição do PL 490.
— Vamos resistir a esse projeto, que fere os direitos dos indígenas, como disseram nossos debatedores. Eu me somo, quero ser liderado para, bravamente, resistir e derrubar essa proposta de lei, quando ela chegar ao Senado — disse.
O senador Paulo Rocha (PT-PA) afirmou que o país tem colocado em dúvida os avanços alcançados pelos povos indígenas. Segundo o parlamentar, o Brasil não tem o preparo necessário para atender os interesses plurais da sociedade ou para cuidar de questões de interesse mundial, como o clima. Ele sugeriu a criação de uma subcomissão mista, juntamente com a Câmara, para ajudar o país a pensar a elaboração de um planejamento estratégico para proteção desses direitos.
— Em nome do desenvolvimento vai se desrespeitando tudo. O Estado brasileiro está a dever esse planejamento para que a gente não fique sofrendo esses sustos de governo em governo — disse.
A líder indígena Alessandra Korap Munduruku denunciou crescentes invasões em territórios indígenas e afirmou que a falta da demarcação representa "um dever não cumprido pelo Estado". Ao dizer que os índios só querem paz, a debatedora disse que os congressistas precisam defender os direitos desses povos previstos na Constituição.
— Nós sabemos onde caçamos, pescamos, onde estão os alimentos e, de repente, aparece um projeto para barrar a demarcação. A Funai não está ao nosso lado. Só quer saber de mineração, madeira, explorar nosso território, deixar nosso rio sujo, floresta derrubada e entregar máquina para a gente. Mas a gente vive de vida — declarou.
O PL 490/2007 foi aprovado em junho na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara e, se confirmado em Plenário, será analisado em seguida pelos senadores. Representante do Programa Povos Indígenas do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), Marcela Menezes questionou as reais intenções da proposição e disse acreditar que o texto defende interesses de terceiros, em vez dos indígenas. Ela defendeu o fortalecimento do gerenciamento territorial pelos índios, “já que eles sabem cuidar e manejar essas áreas de modo a conservar a biodiversidade”.
O líder Davi Kopenawa Yanomami pediu apoio das autoridades e da sociedade civil para a rejeição do PL 490.
— Não ao marco temporal! — apelou.
A CMA aprovou requerimentos de autoria de Jaques Wagner e Confúcio Moura convidando o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, compareça à comissão para debater propostas, planos e direcionamentos da pasta. A data da reunião será agendada.
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