As propostas de reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional são uma ameaça ao Programa Universidade para Todos (ProUni) do Ministério da Educação. A avaliação é de especialistas e parlamentares que participaram nesta quarta-feira (10) de uma audiência pública na Comissão de Educação (CE) do Senado. O debate foi sugerido pelos senadores Flávio Arns (Podemos-PR), Marcelo Castro (MDB-PI), Maria Eliza (MDB-RO) e Nelsinho Trad (PSD-MS).
Para Maria Eliza, iniciativas como o ProUni, o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) e o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) são instrumentos que podem facilitar o acesso de “alunos competentes” à Educação.
— O ProUni é um programa social que, mesmo que não houvesse retorno financeiro, teria um retorno social muito grande. Só vamos mudar o país se tivermos uma educação de qualidade. Esses são instrumentos que não podemos deixar que se enfraqueçam. Devemos fortalecer ao logo do tempo — disse.
O ProUni oferece bolsas de estudo integrais e parciais em instituições particulares de educação superior. O estudante deve comprovar renda familiar bruta mensal per capita de até 1,5 salário mínimo. Para as bolsas parciais, a renda familiar bruta mensal deve ser de até 3 salários mínimos por pessoa.
As instituições que oferecem as bolsas do ProUni são beneficiadas com isenção de quatro tributos: Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS). O benefício equivale a 9,35% sobre o lucro ou a renda das empresas de ensino.
Para Emerson Casali, do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, as propostas de reforma tributária podem tornar o programa “cada vez menos atrativo” para as instituições particulares de ensino superior. Uma das matérias sob análise do Congresso é o Projeto de Lei (PL) 3.887/2020, que cria a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) em substituição a PIS/Pasep e Cofins.
— A proposta da CBS enviada ao Congresso simplesmente tira o PIS/Cofins, que hoje é isento, e não torna a CBS isenta. O setor passaria a pagar CBS. Diante disso, você continuaria dando 9,35% de bolsa, para isentar apenas 2% em impostos. Você praticamente torna inviável o ProUni. Não vai ter nenhum sentido uma instituição dar bolsa do ProUni — argumenta.
Amábile Pacios, da Federação Nacional das Escolas Particulares, classifica o PL 3.887/2020 e o PL 2.337/2021, que altera as regras do Imposto de Renda, como “ameaças ao ProUni”. Ela também critica a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110/2019, que cria o Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS).
— Teríamos uma carga muito aumentada, o que vai significar aumento da mensalidade e esvaziamento das escolas. Acreditamos que o ProUni é um grande programa de inclusão. Entre 102 países, 65 isentam e 20 cobram até 10% sobre a educação. O Brasil já cobra entre até 8,65% de Pis/Cofins e ISS. As propostas de reforma podem levar o país a uma das maiores cargas tributárias do mundo sobre a Educação. É um cenário preocupante — afirmou.
Para Rodrigo Capelato, do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimento de Ensino Superior de São Paulo, não há neutralidade nas propostas de reforma. Ele avalia que o ProUni representa “uma grande eficiência de investimento por parte do Estado” e a mudança nas regras tributárias pode comprometer o programa.
— Desde o início do programa foram concedidas 2,8 milhões de bolsas do ProUni. O Estado teria que ter gasto R$ 111 bilhões para dar a mesma oportunidade aos estudantes em instituições particulares. Considerando a renúncia total de R$ 30 bilhões no mesmo período, o Estado economizou R$ 80 bilhões. Se fosse inserir esses alunos na universidade pública, seriam gastos R$ 263 bilhões. Uma economia de R$ 230 bilhões ao longo de todos esses anos — calcula.
Capelato lembra ainda que a evasão escolar entre alunos do ProUni é menor do que a registrada entre outros estudantes. O abandono no primeiro ano de curso para quem paga a mensalidade é de 26,2%. Em universidades públicas, a taxa é de 14,3%. Entre os beneficiário do Prouni, ela é de 8,8%. Para ele, o ProUni deveria ser expandido.
— Os encargos sociais sobre a folha de pagamentos pagos pelo setor privado de ensino superior são de aproximadamente R$ 5 bilhões por ano. Se a gente pensar no custo de R$ 4,6 mil anuais por aluno, poderíamos, por meio da redução de encargos da folha de pagamento, inserir mais de 1 milhão de alunos. Só temos 18% dos jovens no ensino superior. A taxa de escolarização poderia saltar para 24% — estima.
Para Juliano Griebeler, do Movimento Não à Custa da Educação, a reforma tributária deve ser “mais simples, justa e transparente” e não pode onerar o setor de ensino. Ele avalia que a mudança nas regras como está proposta afetaria especialmente as classes C, D e E, que representam 90% das matrículas no ensino superior particular.
— Quando fala sobre reforma tributária, e há esse risco de aumento dos custos da educação, quem vai ser impactado é quem mais precisa. A reforma tributária não vai solucionar todos os problemas do país, mas pode agravar os problemas da educação aumentando os custos. A gente tem dois pleitos: que não tenha aumento de impostos para a educação e que o ProUni não acabe — afirmou.
Elizabeth Guedes, da Associação Nacional das Universidades Particulares, lembra que o ProUni promove a democratização do acesso ao ensino superior.
— O que acontece com o aluno 100% ProUni? Ele é pardo, trabalha de dia e estuda de noite, anda em transporte público, estuda seis horas por semana a mais do que um estudante branco. O efeito da bolsa do ProUni é elevar a média desse aluno dez pontos em relação ao aluno médio e em quatro pontos em relação aos estudantes de universidades públicas. São 110 mil alunos estudando na idade certa, entre 18 e 25 anos. Isso é uma estatística de aluno branco de classe média, e não de alunos pobres com rendimento até um salário mínimo e meio per capita — destaca.
A audiência pública contou com a participação de Wagner Vilas Boas, secretário de Educação Superior do Ministério da Educação. Ele não fez comentários sobre o impacto das propostas de reforma tributária sobre o ProUni, mas defendeu a manutenção do programa.
— É um tema que nos une. Não temos divergências. O ProUni é uma política pública efetiva que atende a população mais vulnerável deste país. A manutenção e a ampliação dessa política é de fundamental importância — afirmou.
O secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, foi convidado para a audiência pública, mas não compareceu ao debate.
Mín. 21° Máx. 28°