As propostas de reforma tributária hoje tramitando no Parlamento podem encarecer a cadeia produtiva da saúde, prejudicando na ponta final os mais de 213 milhões de brasileiros assistidos pelo sistema. O alerta foi feito por representantes do setor que participaram de audiência na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) nesta quarta-feira (17).
Luciene Amaral, da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos do Ministério da Saúde, disse que projeções da pasta apontam que o fim da isenção de PIS/Cofins sobre esses setores "onerará absurdamente os cofres públicos, com aumento imediato nas despesas de 30%". Ela pediu que os senadores sejam cuidadosos na hora de avaliar propostas como a PEC 110/2019 e o PL 2.337/2021 (que tratam da reforma tributária), pois a área da saúde cada vez mais é marcada pela rapidez na inovação tecnológica e criação de novos medicamentos. Mas essas inovações sempre vêm acompanhadas de altos custos, ressaltou.
Diretor da Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), Bruno Sobral disse que as PECs 110/2019 e 45/2019 (que também trata da reforma tributária) onerarão o consumo tributário de hospitais e laboratórios em 15,5%, e dos planos de saúde, em 21,6%. Aumentos esses que "inevitavelmente serão repassados aos consumidores finais", acrescentou. Sobral afirmou ainda que o impacto tributário dessas reformas, da forma como os textos se encontram, chegará a R$ 11 bilhões, o equivalente a mais de R$ 1 milhão para os planos de saúde, pela média nacional praticada hoje.
— Quando se aumentam os preços na economia, reduz-se a demanda. Os consumidores finais diretamente atingidos ou farão um downgrade (mudança para categoria mais baixa) de seus planos, ou irão parar nas portas dos hospitais públicos — finalizou.
Fabio Cunha, do comitê jurídico da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed), informou que 82% dos países que aplicam IVAs (impostos sobre valor agregado) ou isentam, ou adotam alíquotas diferenciadas (bem mais baixas) para a área da saúde. Isso porque esses países sabem que o encarecimento da saúde suplementar transfere custos para a saúde pública, "a maior consumidora dos serviços". Para Cunha, a majoração em forma de IVAs no Brasil chegando a 12% (na forma da Contribuição sobre Bens e Serviços, a CBS), como por enquanto é previsto nas PECs, põe o país na contramão mundial.
— A reforma trará um encarecimento enorme para toda a cadeia. O mundo todo pratica IVAs com lógicas à parte para a saúde, com alíquotas bem menores ou isenção. Essa lógica deve prevalecer no Brasil, ainda mais num quadro pós-pandêmico. Vale lembrar que a área da saúde é uma das poucas que tem aumentado contratações de trabalhadores no país, com boas médias salariais, e isso também pode ser seriamente afetado pelo aumento dos custo tributários — alertou Cunha.
Outro que reclamou de textos como o PL 2.337/2021 foi Nelson Mussolini, presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma). Para ele, o projeto elegeu a saúde como "alvo", ao onerar medicamentos em 12%. Mussolini acrescenta que projeções da Sindusfarma apontam para aumentos nos gastos públicos em 30%.
— Falei com Paulo Guedes (ministro da Economia) que se eu fosse ministro da Saúde, iria acampar na sala dele pra barrar esse e outros absurdos. Só o Ministério da Saúde terá um impacto imediato de R$ 4 bilhões em gastos com medicamentos. E o que o ministério não conseguir entregar, vai sobrar para as secretarias estaduais e municipais. E programas como o Farmácia Popular serão inviabilizados — alertou Mussolini.
A vice-presidente da CAS, senadora Zenaide Maia (Pros-RN), defendeu o fim da isenção na distribuição de dividendos como forma de financiar a saúde pública. Ela citou estudo da Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais) apontando que essas isenções já se aproximam de R$ 60 bilhões ao ano. Para a senadora, a reforma ainda deve apontar para as isenções hoje vigentes para o setor petrolífero. No entanto, ela concordou com os participantes da audiência, afirmando que também defende cargas menores sobre a cadeia de consumo da saúde.
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