O Senado aprovou, nesta quarta-feira (8), projeto que obriga a preservação do sigilo sobre a condição de pessoa infectada pelos vírus da imunodeficiência humana (HIV), das hepatites crônicas (HBV e HCV) e de pessoa com hanseníase e tuberculose, no âmbito dos serviços de saúde; dos estabelecimentos de ensino; dos locais de trabalho; da administração pública; da segurança pública; dos processos judiciais e das mídias escrita e audiovisual. O texto aprovado foi um substitutivo da Câmara dos Deputados (PL 315/2021) ao PLS 380/2013, de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e foi relatado em Plenário pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE).
O texto proíbe a divulgação, seja por agentes públicos ou privados, de informações que permitam a identificação dessas pessoas. Já o sigilo profissional somente poderá ser quebrado nos casos determinados por lei, por justa causa ou por autorização expressa da pessoa com o vírus. Se a pessoa for menor de idade, dependerá de autorização do responsável legal.
Por ter sido modificada pelos deputados, a proposição retornou para nova análise no Senado. Agora, a matéria segue para sanção presidencial.
Os serviços de saúde, públicos ou privados, e as operadoras de planos privados de assistência à saúde estão obrigados a proteger as informações relativas a essas pessoas, bem como a garantir o sigilo das informações que eventualmente permitam a identificação dessa condição. A obrigatoriedade de preservação do sigilo recai sobre todos os profissionais de saúde e os trabalhadores da área de saúde.
A proposta estabelece ainda que o atendimento nos serviços de saúde, públicos ou privados, será organizado de forma a não permitir a identificação, pelo público em geral, da condição de pessoa que vive com infecção pelos vírus da imunodeficiência humana (HIV) e das hepatites crônicas (HBV e HCV) e de pessoa com hanseníase e com tuberculose.
O projeto estabelece que os inquéritos ou os processos judiciais que tenham como parte pessoa que vive com as doenças citadas devem prover os meios necessários para garantir o sigilo da informação sobre essa condição. Qualquer divulgação a respeito de fato objeto de investigação ou de julgamento não poderá fornecer informações que permitam a sua identificação.
Em julgamento no qual não seja possível manter o sigilo sobre essa condição, o acesso às sessões somente será permitido às partes diretamente interessadas e aos respectivos advogados.
O descumprimento das disposições da Lei sujeita o agente público ou privado infrator às sanções previstas no artigo 52 da Lei nº 13.709/2018, a chamada Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), bem como às demais sanções administrativas cabíveis, e obriga-o a indenizar a vítima por danos materiais e morais.
As penas previstas na LGPD, bem como as indenizações pelos danos morais causados à vítima, serão aplicadas em dobro quando a divulgação da informação sobre a condição da pessoa for praticada por agentes que, por força de sua profissão ou do cargo que ocupam, estão obrigados à preservação do sigilo sobre essa condição, e ficar caracterizada como intencional e com o intuito de causar dano ou ofensa.
Entre as sansões previstas no artigo 52 da LGPD estão: advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; multa simples, de até 2% do faturamento da pessoa jurídica de direito privado, grupo ou conglomerado no Brasil no seu último exercício, excluídos os tributos, limitada, no total, a R$ 50 milhões de reais por infração; multa diária; publicização da infração após devidamente apurada e confirmada a sua ocorrência; bloqueio dos dados pessoais a que se refere a infração até a sua regularização; eliminação dos dados pessoais a que se refere a infração.
O relator, senador Rogério Carvalho, afirmou que as inovações feitas na Câmara dos Deputados foram bem-vindas, incluindo pessoas com hepatite B ou C, tuberculose ou hanseníase na proposta original. Foi adotada também, de acordo com ele, emenda de redação para substituir, em todo o texto do projeto e na sua ementa, a locução “portador de”, nas expressões “portador do vírus da imunodeficiência humana” ou “portador do HIV”, pela expressão “pessoa que vive com”.
Para Rogério Carvalho, não há dúvidas de que a população de pessoas soropositivas é estigmatizada e diariamente sofre com o preconceito e com outras barreiras sociais que as impedem de desfrutar de plena cidadania, na medida em que seu acesso a emprego, educação e a outros direitos são diretamente afetados.
— As discriminações ocorrem a partir do momento em que essa condição de saúde é conhecida, mesmo que não influa em seu desempenho no trabalho ou em outras atividades, até porque a evolução do tratamento dessa enfermidade permitiu grande melhora na expectativa e na qualidade de vida dos indivíduos acometidos — disse em Plenário.
Outra modificação promovida pelos Deputados é a retirada da caracterização como crime da divulgação de que a pessoa vive com os vírus HIV, hepatites B ou C, tuberculose ou hanseníase, para mencionar expressamente o art. 52 da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
— Em nossa avaliação, a alteração proposta pelo Substitutivo não implica abrandamento das consequências da quebra do sigilo, pois o Código Penal, notadamente em seus arts. 153 e 154, continua aplicável à conduta mencionada, mesmo sem menção expressa, de modo que a interpretação dos fatos pode levar as autoridades de persecução penal a processar criminalmente os infratores. Ainda assim, seria prudente submeter os infratores a sanções administrativas bem delimitadas, nos termos do art. 52 da LGPD - argumentou.
O relator promoveu ajuste redacional do artigo 6º, sem alteração de mérito, para deixar o texto mais claro e afastar dúvidas de interpretação.
O autor do projeto, senador Randolfe Rodrigues, destacou que a proposta atende o anseio do movimento nacional das pessoas vivem com essas doenças, que há muito tempo desejava a aprovação do projeto, que tramita no Congresso Nacional desde 2018.
— Nós Temos no brasil 920 mil pessoas que vivem com HIV. Quase um milhão de brasileiros vivem com HIV. A ausência do sigilo é uma das circunstâncias que mais constrangem as pessoas. Hoje, com avanço da ciência, é perfeitamente compreensível e é necessário ser assegurado, ser garantido a essas pessoas, o direito civilizatório, o direito humanitário básico ao sigilo — destacou o parlamentar.
Randolfe informou ainda que no Brasil são mais de 254 mil pessoas diagnosticadas com o vírus da hepatite B e mais de 262 mil pessoas diagnosticadas com o vírus da hepatite C. Ele elogiou o trabalho feito pelo relator no Senado e na Câmara dos Deputados, deputado Alexandre Padilha (PT-SP).
— Sobretudo, senador Rogério, essa matéria é um ‘chega pra lá’ nas possibilidades de discriminação que eram chanceladas, lamentavelmente, pelo Estado brasileiro. Estabelecer, garantir o sigilo é um direito a essas pessoas, e é uma vitória sobretudo do movimento nacional das pessoas que vivem com essas enfermidades — afirmou.
Randolfe afirmou que é fundamental pedir a atenção do presidente da República para que a matéria, de caráter humanitário, não seja objeto de qualquer tipo de veto.
— Nós estamos aprovando no mês do laço vermelho, no mês que se inicia com primeiro de dezembro, que é o Dia Mundial de Luta contra a Aids. É uma homenagem mais do que adequada que o Congresso Nacional faz a essas pessoas e eu rogo pela sansão do presidente da República — destacou.
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