O orçamento da União deverá ter R$ 36 bilhões em espaço fiscal adicional no próximo ano, mas isso virá às custas de uma deterioração da confiança na capacidade do país de lidar com as contas públicas. Essa é a conclusão da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI) no seu relatório de acompanhamento fiscal do mês de dezembro, publicado nesta quinta-feira (16).
A folga fiscal é resultado das mudanças efetuadas pelas emendas constitucionais 113 e 114, que vieram da PEC dos Precatórios (PEC 23/2021). Elas mudam a fórmula de cálculo do teto de gastos e limitam o pagamento de dívidas judiciais da União. O valor de R$ 35,5 bilhões disponíveis já leva em conta o pagamento do Auxílio Brasil. De acordo com a emenda 114, o valor deve ser usado integralmente em políticas sociais.
No entanto, a IFI argumenta que a forma como o teto de gastos foi alterado pelas emendas constitucionais coloca em xeque a sua utilidade como “âncora” das expectativas do mercado em relação aos compromissos do Brasil com a sua política fiscal. Sem essa confiança, o efeito deve ser um encarecimento da dívida pública brasileira.
“O desafio fiscal de médio prazo continua o mesmo, mas agora na presença de um quadro fiscal permeado por mudanças profundas no teto de gastos. A perda de credibilidade da política fiscal associada à chamada PEC dos Precatórios reflete-se nos juros mais altos e na dinâmica da dívida. Além disso, produz menores oportunidades de crescimento econômico para 2022”, avalia a IFI.
Pelos cálculos da instituição, o espaço fiscal adicional para 2022 deve ser de R$ 117,9 bilhões. A mudança no teto deve responder por 62% desse valor (R$ 73,2 bi), devido ao IPCA que deve fechar o ano em 10,4%. Pela nova fórmula, o teto é reajustado pela inflação de janeiro a dezembro - antes, era o índice registrado entre julho do ano anterior e junho do corrente. Os R$ 44,7 bi restantes virão do novo regime de pagamento de precatórios.
O espaço deve ser ocupado, principalmente, pelo Auxílio Brasil, estimado em R$ 50 bi. Ainda seriam destinados R$ 17,5 bi para a correção de benefícios da Previdência, R$ 6,1 bi para os pisos da saúde e da educação, R$ 4,3 bi para outros benefícios assistenciais, R$ 2 bi para subsídios, R$ 1,6 bi para o aumento do teto dos demais poderes e R$ 0,9 bi para despesas de pessoal. Sobrariam, ainda, cerca de R$ 36 bilhões.
A emenda constitucional 114, oriunda da PEC dos Precatórios, reserva esse dinheiro para ações sociais, mas a regra se aplica ao espaço aberto ostensivamente pelas mudanças sugeridas na PEC. A IFI observa que, se o Planalto e a Comissão Mista de Orçamento (CMO) conseguirem “limpar” mais o teto a partir de reavaliação das despesas, esta nova folga poderia ser usado sem restrições.
“A destinação desse espaço dependerá de como a peça orçamentária será modificada. Ofício enviado pelo Ministério da Economia à CMO indica que o governo, quando comparadas as suas estimativas às da IFI, poderia estar superestimando os efeitos da inflação sobre os gastos obrigatórios. Se o Congresso decidir revisar as projeções com base em avaliações técnicas e projeções próprias, haveria espaço para aumento de despesas, via emendas de relator-geral, muito provavelmente”.
A relação entre a dívida bruta do governo geral (DBGG) e o PIB teve trajetória positiva ao longo do ano de 2021, mas a IFI explica que isso foi resultado da alta da inflação, que fez subir as estimativas para o resultado econômico do país. A partir dos meses de setembro e outubro, com a situação do PIB mais consolidada, a dívida se estabilizou no patamar de 83% do PIB, e esse percentual deve crescer nos próximos anos com a perspectiva de juros em patamar mais elevado. No cenário pessimista da IFI, a dívida ultrapassaria 100% do PIB em 2025.
Outro impacto da inflação aparece no cálculo do déficit público. Como a inflação aumenta a arrecadação, a previsão da IFI é de um déficit de R$ 83,6 bilhões em 2021, ou 1% do PIB - menor do que a projeção atual do governo, de R$ 95,8 bilhões. O cenário atual pode levar a um retorno ao superávit fiscal já em 2025, mas a IFI chama atenção para as tendências recentes.
“O novo cenário é melhor para 2021 e levemente pior para 2022. Vale destacar que para 2022, em particular, a piora das estimativas decorre de um cenário macroeconômico pior que o previsto no cenário de outubro”, destaca a instituição.
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