Em 2021, houve 4.653 tiroteios na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, com uma média de 13 por dia. As ações policiais resultaram em 2.098 pessoas baleadas, sendo 1.084 mortas e 1.014 feridas, que representam cinco baleados a cada 24 horas. No mesmo ano, 17 crianças e 43 adolescentes foram baleados na Região Metropolitana.
Os números fazem parte do Relatório Anual 2021 do Instituto Fogo Cruzado, publicado hoje (12) na página da plataforma digital colaborativa criada para registrar a ocorrência de tiroteios e de violência armada.
O instituto destacou que esses casos ocorreram mesmo com a vigência, desde junho de 2020, da decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), determinando que as operações policiais nas comunidades do Rio de Janeiro só devessem ocorrer em ocasiões excepcionais e precisam ser comunicadas ao Ministério Público do estado.
A morte do menino João Pedro, baleado durante uma operação policial, no conjunto de favelas do Salgueiro, em São Gonçalo, no dia 18 de maio de 2020, foi o que levou o STF a tomar medidas para conter a violência nessas localidades. A ADPF 635 buscava evitar que moradores que se protegiam da pandemia em suas residências fossem vítimas dos tiroteios. Dados do Relatório apontam que naquele ano, houve 4.585 tiroteios no Grande Rio, com 1.795 baleados, sendo 896 mortos e 899 feridos.
A diretora executiva do Instituto Fogo Cruzado, Cecília Olliveira, defendeu a importância do planejamento e das justificativas das operações, como também as investigações quando necessário, como no caso do menino João Pedro. “Sem planejamento, inteligência, responsabilidade e a devida fiscalização do Ministério Público, que tem entre suas funções o controle externo da atividade policial, não haverá mudanças. Pelo contrário, este ano, o Gaeco, grupo que investigava excessos e má conduta policial, foi extinto. Hoje há apenas um grupo menor e temporário fazendo parte do trabalho. Quem se preocupa com estas famílias e com o futuro destas crianças e adolescentes?”, disse
O Relatório 2021 indica também a ocorrência de 61 chacinas na Região Metropolitana, quando 255 pessoas foram mortas. “As ações ou operações policiais foram responsáveis por três a cada quatro chacinas ocorridas no Grande Rio, vitimando 195 civis no total”.
Conforme o documento, foi em uma operação policial no Jacarezinho, na zona norte do Rio, no dia 6 de maio, que 28 pessoas foram mortas, entre elas um policial civil. A Chacina do Jacarezinho, como ficou conhecida, foi a operação mais letal da história da polícia do Rio de Janeiro. Além do número de mortos, houve ainda cinco baleados, sendo dois policiais civis e três vítimas de balas perdidas, entre elas dois passageiros do metrô e um morador da região.
O Ministério Público denunciou dois policiais pelos crimes de homicídio doloso e fraude processual cometidos durante a operação.
Em relação ao ano anterior, quando foram anotadas 44 chacinas com 170 mortos, houve aumento de 39% nos casos e de 50% nas mortes. 33 das chacinas ocorridas em 2020 foram em ações e operações policiais.
Das 17 crianças e 43 adolescentes baleados na Região Metropolitana do Rio em 2021, quatro crianças e 15 adolescentes não resistiram e morreram, sendo que duas crianças foram atingidas por bala perdida. Alice Pamplona, de 5 anos, ferida nas primeiras horas de 2021, e Manuela Griffo, de 9 anos, nos últimos dias do ano anterior. Em 2020, foram 22 crianças e 40 adolescentes baleados no Grande Rio.
Cecília Olliveira questionou a garantia de segurança para as crianças e adolescentes. “Muito se fala na proteção de crianças e adolescentes, mas quase nada é feito para garantir isso. Os dados mostram que eles estão sendo feridos, mortos, que têm problemas psicológicos, mas pouco ou nada é feito por aqueles que têm o dever constitucional de garantir um crescimento saudável e com direitos garantidos para estes pequenos cidadãos”, observou.
O Relatório 2021 do Instituto Fogo Cruzado apontou ainda que 181 agentes de segurança foram baleados no Grande Rio em 2021. Entre as vítimas, 82 morreram. A categoria mais afetada pela violência armada foi a de policiais militares, representando 77% do total de baleados. Se comparado a 2020, houve aumento de 52% entre os mortos e de 13% entre os feridos. Naquele ano, 142 agentes de segurança foram baleados, sendo 54 mortos e 88 feridos.
Cecília Olliveira cobrou a divulgação do plano de segurança do Rio de Janeiro, que, segundo ela, não consta em lugar algum. “Isso dificulta que jornalistas, pesquisadores e gestores públicos cobrem medidas que poupam a vida dos agentes de segurança pública, já que não temos sequer um plano de segurança para nos basear”, disse.
O Instituto Fogo Cruzado usa tecnologia para produzir e divulgar dados abertos e colaborativos sobre violência armada, como forma de fortalecer a democracia por meio da transformação social e da preservação da vida. “O laboratório de dados da instituição produz mais de 20 indicadores inéditos sobre violência nas regiões metropolitanas do Rio, do Recife e, em breve, em mais cidades brasileiras. Através de um aplicativo de celular, o Fogo Cruzado recebe e disponibiliza informações sobre tiroteios, checadas em tempo real, que estão no único banco de dados aberto sobre violência armada da América Latina, que pode ser acessado gratuitamente pela API do Instituto”, relatou.
A Secretaria de Estado de Polícia Civil (Sepol) do Rio de Janeiro informou à Agência Brasil que todas as operações da atual gestão são baseadas nos pilares de inteligência, investigação e ação, e cumprem as decisões da ADPF 635. “Além disso, as ações policiais têm alcançado redução constante nos índices de violência registrados pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), com resultados, em alguns setores, que são os melhores desde o início da série histórica”, diz a nota da secretaria.
A Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que as ações realizadas pela corporação estão rigorosamente de acordo com o que determina a ADPF 635 do STF. “Transparentes e protegidas pela legislação em vigor, as operações são precedidas de informações do setor de inteligência da Corporação e de órgãos oficiais, sendo executadas com base em protocolos técnicos com foco central na preservação de vidas - da população local e de policiais militares envolvidos na ação. Além de ser comunicado previamente, o Ministério Público estadual recebe relatórios sobre os resultados das operações, como pode acompanhá-las em tempo real por meio de um aplicativo desenvolvido com essa finalidade”, disse.
Ainda conforme a secretaria, a atuação da Polícia Militar têm contribuído “de forma significativa para redução expressiva e contínua dos indicadores criminais mais impactantes, tanto de crimes contra a vida como crimes contra o patrimônio”.
De acordo com a secretaria, ao longo de 2021, somente a Polícia Militar do Rio de Janeiro apreendeu 6.278 armas de fogo, sendo 288 fuzis, além de ter efetuado 33.052 prisões e 3.999 apreensões de adolescentes.
A secretaria destacou que o órgão responsável pela divulgação oficial dos índices da segurança pública no estado do Rio de Janeiro é o Instituto de Segurança Pública (ISP).
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