O Senado retomou nesta terça-feira (28) o debate sobre o projeto de lei que obriga planos de saúde a cobrirem tratamentos não previstos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Já no início da sessão, o relator do PL 2.033/2022, senador Romário (PL-RJ) e outros senadores manifestaram apoio à proposta, enquanto que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e representantes da ANS alertaram para o risco da nova lei ameaçar a “sustentabilidade” das empresas que operam os planos de saúde.
O projeto dá à lista de procedimentos cobertos pelos planos de saúde um caráter exemplificativo, e não taxativo, como defendem essas empresas. Para as associações ligadas a pacientes que utilizam remédios e procedimentos ainda não incorporados à lista, a adoção do rol taxativo significa deixar os doentes sem tratamento.
Romário sinalizou que apresentará parecer favorável ao texto já aprovado pela Câmara dos Deputados. A expectativa, segundo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, é que o projeto seja votado até o final do mês.
— Não podemos negar a essas pessoas o direito de uma existência digna e com menos sofrimento. Muitos brasileiros e brasileiras pagam caro por planos de saúde para garantir o melhor tratamento a suas famílias — disse Romário.
Diretora do Mães de Movimento pelo Autismo, Letícia Amaral argumentou que o projeto assegura a incorporação de tratamentos e medicamentos comprovadamente eficazes. Ela apontou que o rol taxativo acaba por limitar o acesso a medicamentos e defendeu a aprovação do texto que veio da Câmara sem mudanças.
— Não pode a norma ser tão detalhadamente específica, principalmente quando a lei é voltada para uma situação dinâmica. Estamos falando de saúde. A ciência da saúde se modifica em ritmo veloz, mas quem tem que dizer não será o legislador, mas a comunidade científica. O texto não abre brecha para charlatanismo. Dá apenas aos pacientes o direito de lutarem por suas vidas. O PL não é uma carta branca para qualquer medicamento. O rol taxativo mata — disse Letícia Amaral.
A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) reforçou o apelo de pacientes e familiares de pessoas com deficiência e doenças raras.
— Defendo o caráter exemplificativo. O rol taxativo coloca em risco milhares de brasileiros e brasileiras. É um drama o que vivem inúmeras famílias de pessoas com deficiência, doenças degenerativas e raras que precisam lutar na justiça para tratamentos que não constam no rol da ANS — disse a senadora.
Marcelo Queiroga apontou riscos para a sustentabilidade financeira dos planos de saúde em caso de aprovação do projeto e afirmou que a ANS é ágil na incorporação de tecnologias e novos tratamentos. Ele defendeu o rol taxativo como forma de assegurar a incorporação de medicamentos e terapias com comprovação científica. O ministro da Saúde afirmou ainda que a atual redação do projeto pode encarecer os planos de saúde.
— A legislação já traz de maneira muito clara um processo para incorporação de tecnologias no âmbito da saúde suplementar, com previsibilidade e critérios claros, e que permite segurança e equidade nas incorporações de tecnologias em saúde. [...] O objetivo é ampliar o acesso, mas [é preciso] ampliar o acesso com qualidade. Se não houver essa avaliação, será automaticamente repassado para os beneficiários da saúde complementar os custos da incorporação — declarou.
Assim como Queiroga, Vera Valenta, da Federação Nacional de Saúde Suplementar, disse que as mudanças previstas no projeto podem inviabilizar o setor de saúde privada. Ela afirmou que a incorporação de novas tecnologias hoje considera a eficácia dos tratamentos e segue procedimentos criteriosos.
— Os recursos são finitos, por isso decidir sobre a natureza do rol é decidir sobre a própria existência dos planos. A ampliação de procedimento é desejável, mas é exatamente por isso que existe um processo de avaliação de tecnologias — disse Vera Valenta.
Autor do requerimento para realização do debate, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, destacou a complexidade do tema:
— O tema é uma questão candente do debate público brasileiro. Opõe dois valores caros ao ordenamento jurídico. Em primeiro lugar, temos o direito à saúde, direito universal previsto no art. 196 da Constituição. Segundo, temos os inúmeros dispositivos que defendem a livre iniciativa e a regulação eficiente da atividade econômica do setor privado, que é o provedor dos serviços de saúde suplementar — assinalou.
O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) disse temer que a aprovação do texto se torne um “tiro no pé”. Ele afirmou que defende a ampliação do acesso, mas manifestou preocupação com uma possível elevação dos preços dos planos de saúde.
— Só um monstro ficaria contra fazer o tratamento chegar a quem precisa. Quero que essa lei ajude a fazer o bem. Tenho medo de que ela não cumpra esse objetivo. Quero que todos tenham acesso. O grande problema é: qual é a melhor forma? — ponderou.
Os deputados aprovaram a proposta no começo de junho, após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidir que o rol de procedimentos e eventos em saúde tem caráter taxativo, não apenas exemplificativo — assim, as operadoras de saúde estariam desobrigadas de cobrir tratamentos não previstos na lista, salvo algumas situações excepcionais. Se o texto for aprovado sem mudanças pelos senadores, ele seguirá para a sanção.
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