Projeto de lei prevê que a qualidade e a oferta do ensino básico público serão medidos e acompanhados, entre outros, por indicadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). Também determina que a má gestão poderá ser punida civilmente — inclusive como crime de responsabilidade no caso de prefeitos e governadores. O projeto (PL 88/2023) foi apresentado pelo senador Flávio Arns (PSB-PR).
Ao explicar sua iniciativa, o senador argumenta que é necessária uma lei de responsabilização educacional. “Estamos muito habituados a ouvir sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal", lembra ele. "Precisamos de uma legislação capaz de incentivar o crescente fortalecimento da cultura de responsabilidade educacional por parte dos nossos gestores públicos."
Segundo Arns, a ausência desse tipo de legislação foi especialmente negativa durante “uma pandemia tão insidiosa como a decorrente do coronavírus, que impactou de forma significativa as escolas e a aprendizagem dos estudantes, especialmente os mais novos, em fase de alfabetização e de consolidação dos fundamentos matemáticos”.
A lei de responsabilidade educacional já estava prevista, desde 2014, no Plano Nacional de Educação (PNE - Lei 13.005, de 2014), sendo apresentada como uma das estratégias para aumentar os investimento em educação. Mas ainda não foi criada.
A PNE cria diretrizes, metas e estratégias para a educação pelo período de dez anos (o plano, portanto, encerra sua vigência em 2024). Segundo Arns, pode-se afirmar que, "segundo relatórios consistentes produzidos pela Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), grande parte do que nele se inscreveu [no PNE] não se concretizará".
O projeto de Arns prevê que a qualidade e a oferta da educação serão medidas e acompanhadas por indicadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, que está sob a responsabilidade do Inep. Criado em 1990, o Saeb é composto por testes e questionários sobre o contexto da educação básica.
O PL 88/2023 determina que os diagnósticos do Saeb devem observar alguns critérios para que a gestão na educação seja considerada responsável. De acordo com a proposta, os gestores devem oferecer creches para crianças de até quatro anos de famílias que "demandem esse tipo de atendimento" e devem escolher diretores de escola por seus méritos, além de criar planos de carreira para profissionais de educação e estender progressivamente a jornada escolar para o período integral.
O texto também estipula que estados e municípios poderão instituir seus próprios indicadores de qualidade da educação, que complementarão a avaliação feita pelo Saeb.
Um importante critério citado pelo projeto é o Custo Aluno Qualidade (CAQ), que corresponde ao valor mínimo que o poder público precisa investir por aluno para que haja uma educação de qualidade.
O CAQ estava previsto desde 2014 no PNE, e em 2020 foi incluído na Constituição Federal como padrão mínimo de referência de qualidade do ensino básico. O texto constitucional exige uma lei complementar que explique esse parâmetro.
Flávio Arns também é autor do PLP 235/2019, projeto de lei complementar que trata do CAQ, já aprovado no Senado e em análise na Câmara dos Deputados.
O PL 88/2023 prevê o envio de relatórios por governadores (às assembleias legislativas) e prefeitos (às câmaras municipais). Esses documentos deverão mostrar, no início dos respectivos mandatos, as condições das escolas e indicar ações para os próximos anos.
Ao fim de cada mandato, outro relatório deverá ser enviado indicando os avanços dos primeiros três anos da respectiva gestão. Como o Poder Legislativo possui a atribuição de fiscalizar o Poder Executivo, os parlamentares terão subsídios para analisar o cumprimento das responsabilidades educacionais.
O projeto inclui dois artigos na Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429, de 1992) para punir os responsáveis que não ofereçam educação de qualidade, caso seja comprovada negligência ou má-fé. Assim, deixar de cumprir as metas dos planos de educação poderá ser considerado ato que causa prejuízo ao erário. Os responsáveis que se enquadrarem nesse caso poderão perder a função pública e ter seus direitos políticos suspensos por até 12 anos, entre outras punições.
O texto também prevê punição para quem dificultar a transição de mandatos políticos de modo a prejudicar a continuidade do serviço público ou a prestação de contas. O responsável poderia sofrer multa de até 24 vezes a remuneração e ser proibido de contratar com o poder público, entre outras penalidades.
Além disso, o projeto cria a figura da ação civil pública de responsabilidade educacional. Na prática, os responsáveis podem ser processados pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública e até por associações civis que cumpram requisitos exigidos por lei. Segundo Arns, a ideia é que os danos “possam ser objeto de reparação judicial”. Assim, o desrespeito à responsabilidade educacional seria equiparado aos danos ao meio-ambiente e a outros interesses coletivos.
A proposta aguarda despacho.
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