A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) começa a avaliar neste sábado (24), na China (o horário do país asiático tem uma diferença de 11 horas em relação ao brasileiro), as candidaturas aos próximos patrimônios mundiais culturais e naturais. O Brasil é representado pelo Sítio Roberto Burle Marx (SRBM), em Barra de Guaratiba, zona oeste da cidade do Rio de Janeiro. Cada país só pode apresentar um bem a cada ano.
A 44ª sessão do Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco será realizada na cidade de Fuzhou, na China, após o intervalo de um ano. A reunião será presidida pelo vice-ministro da Educação da China e diretor da Comissão Nacional da China para a Unesco, Tian Xuejun.
O comitê analisará as indicações da lista da Unesco, começando pelas candidaturas que não puderam ser avaliadas no ano passado, devido à pandemia de covid-19. O sítio brasileiro é um desses casos. Ele está na lista ao lado do Observatório Solar de Chankillo e centro cerimonial, no Peru; da Capela Scrovegni de Giotto e os ciclos de afrescos de Pádua do século 14, da Itália; dos Monumentos de Pedra de Cervos e Locais Relacionados, o Coração da Cultura da Idade do Bronze, da Mongólia, entre outros locais culturais.
A decisão sobre o Sítio Burle Max é aguardada para segunda-feira (26). De acordo com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que passou a gerir o sítio a partir de 1994, após a morte de Burle Max, a chancela pode garantir ao Brasil o 23º bem na lista de patrimônios mundiais da Unesco. O local sintetiza a obra do paisagista, como um laboratório de experimentações botânicas e paisagísticas.
O 22º bem nacional chancelado como patrimônio mundial misto de cultura e biodiversidade é o conjunto das localidades de Paraty e Ilha Grande, na Costa Verde fluminense.
Para a presidente do Iphan, Larissa Peixoto, o possível reconhecimento do sítio como patrimônio mundial é "motivo de orgulho para o Iphan e para toda a população, de grande importância para nosso país, pois valoriza o legado desse espaço singular".
O instituto atua desde 1985 na preservação do sítio, quando a propriedade foi doada ao Iphan pelo próprio paisagista. O órgão assumiu a gestão após a morte do paisagista. “Trata-se de uma unidade especial com a missão de preservar, para as futuras gerações, um espaço de aprendizado e de fomento ao conhecimento sobre natureza, paisagismo, arte e botânica", disse a presidente do Iphan.
O antigo Sítio Santo Antônio da Bica, adquirido em 1949 por Roberto Burle Marx e seu irmão, Guilherme Siegfried, deu partida ao que hoje constitui o Sítio Burle Marx. O local se destaca pela vegetação nativa, formada principalmente por manguezal, restinga e a Mata Atlântica, preservada pelo Parque Estadual da Pedra Branca. Os irmãos compraram posteriormente outros terrenos que foram anexados ao sítio.
O local sofreu intervenções para ser transformado no laboratório pretendido por Burle Marx. Em 1985, o paisagista doou o local ao governo federal, no intuito de assegurar a continuidade das pesquisas, a disseminação do conhecimento adquirido e o compartilhamento daquele espaço com a sociedade.
O sítio tem área de 407 mil metros quadrados e abriga uma coleção com cerca de 3,5 mil espécies de plantas tropicais e subtropicais. “Estamos trabalhando em um inventário referenciado dessa coleção. É um trabalho longo”, disse à Agência Brasil a diretora do SRBM, Claudia Storino.
Jardins, viveiros de plantas, sete edificações e seis lagos integram o espaço, que oferece ao público também um acervo museológico de mais de 3 mil itens, com coleções de arte cusquenha, pré-colombiana, sacra e popular brasileira, além da coleção de obras do próprio paisagista e artista, que já estão catalogadas e informatizadas em sistema online.
Para concorrer ao título de Patrimônio Mundial da Unesco, o Sítio passou por um processo de requalificação a partir de outubro de 2018, que foi concluído em fevereiro deste ano. Por meio da Lei de Incentivo à Cultura, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) investiu cerca de R$ 5,4 milhões em intervenções no local, com o objetivo de valorizar espaços de visitação, implementar acessibilidade, ampliar o acesso público e potencializar ações de pesquisa.
Roberto Burle Marx não foi somente paisagista. Foi também artista plástico, pintor, escultor, designer de joias, figurinista, cenógrafo, ceramista e tapeceiro. Nascido em São Paulo, foi criado no Rio de Janeiro, onde morreu em 4 de junho de 1994. Com milhares de projetos espalhados pelo mundo, Burle Marx concebeu paisagens de destaque no país, como os jardins do Complexo da Pampulha, em 1942; o jardim do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1954; o paisagismo do Aterro do Flamengo, em 1961; os jardins da sede da Unesco, em Paris; e o famoso traçado do calçadão de Copacabana, em 1970, entre outras.
Burle Marx introduziu o paisagismo modernista no Brasil e foi um dos primeiros paisagistas a utilizar plantas nativas brasileiras em seus projetos. Foi também um dos pioneiros ambientalistas a reivindicar a conservação das florestas tropicais no Brasil, tendo organizado muitas expedições e excursões pelos biomas nacionais, onde descobriu mais de 30 novas espécies de plantas que levam seu nome.
O primeiro projeto de jardim público idealizado por Burle Marx foi a Praça de Casa Forte, no Recife, em 1934. Em 1961, projetou também o paisagismo para o Eixo Monumental de Brasília e, em 1968, projetou o paisagismo da Embaixada do Brasil em Washington, Estados Unidos.
Conhecido internacionalmente como um dos mais importantes paisagistas do século 20, Roberto Burle Marx viveu no Sítio entre 1973 e 1994. Reuniu plantas de diversas partes do mundo na propriedade, algumas, inclusive, em risco de extinção.
A diretora do Sítio Roberto Burle Marx, Claudia Storino, está muito confiante em que o local passará a ser patrimônio mundial da Unesco. “O Sítio merece muito. Estamos muito confiantes também que há de sair tudo bem, como esperado”.
Em condições normais, o sítio tem capacidade para receber a média de 140 pessoas por dia. As visitações são previamente agendadas e ocorrem de terça-feira a sábado, exceto feriados. A visita guiada dura em torno de uma hora e meia e e? feita a pe?, percorrendo um trajeto de 1.800 metros, desde o ponto de partida. As inscrições para visitação podem ser feitas no endereço [email protected].
As visitas foram reabertas em janeiro deste ano, mas com quantidade controlada de pessoas, de modo a garantir a segurança de todos (equipe do SRBM e visitantes). Devido à pandemia, as visitas estão acontecendo em pequenos grupos. São obrigatórios o uso de máscaras, higienização das mãos, álcool em gel e distanciamento.
O endereço é Estrada Roberto Burle Marx, número 2019. Maiores informações podem ser obtidas pelo telefone (21) 24101412. A diretora do SRBM acredita que a visitação vai ser ampliada em função da candidatura na lista da Unesco. “Acreditamos que vai dar certo”. Completou que a partir da chancela, “o Sítio ganha um fôlego ainda maior”.
A lista de patrimônios mundiais culturais brasileiros reconhecidos pela Unesco inclui Brasília (DF), Cais do Valongo (RJ), Centro Histórico de Goiás (GO), Centro Histórico de Diamantina (MG), Centro Histórico de Ouro Preto (MG), Centro Histórico de Olinda (PE), Centro Histórico de São Luís (MA), Centro Histórico de Salvador (BA), Conjunto Moderno da Pampulha, em Belo Horizonte (MG), Missões Jesuíticas Guaranis (RS), ruínas de São Miguel das Missões (RS), Parque Nacional Serra da Capivara (PI), Praça São Francisco (SE), paisagens cariocas entre a montanha e o mar (RJ) e o Santuário do Bom Jesus de Matozinhos (MG).
No Brasil também são considerados patrimônios mundiais naturais o Complexo de Áreas Protegidas do Pantanal (MT/MS), o Complexo de Conservação da Amazônia Central (AM), a Costa do Descobrimento - Reservas da Mata Atlântica (BA/ES), Ilhas Atlânticas - Fernando de Noronha e Atol das Rocas (PE/RN), Parque Nacional do Iguaçu (PR), Reservas da Mata Atlântica (PR/SP), Reservas do Cerrado e Parques Nacionais da Chapada dos Veadeiros e das Emas (GO).
Como patrimônio misto, o Brasil tem somente um bem reconhecido, que é a cidade histórica de Paraty e a Ilha Grande.
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